quinta-feira, 19 de agosto de 2010

4/08 a 14/08 - Um pouco de Cuba (parte 1)

Por Carlos Gimenes

“E então, era isso que você esperava?”


Minha expectativa foi sanada porque tinha em minha mente linhas gerais sobre o que é Cuba. Dez dias e cinco cidades depois, as linhas estão mais definidas e detalhadas, mas a premissa de reconhecimento breve dos lugares e que é necessário muito mais tempo para de fato entendê-los não só está presente como se torna cada dia mais óbvia. De todo modo, com esta viagem novos elementos compõem meu entender sobre a nossa Latinoamérica.
Elencando temas rapidamente temos:

Hambre
Senhoras e senhores, o assunto é sério: não há fome. Não nos moldes como conhecemos no Brasil, vimos no México ou imaginamos em outras regiões que estão mais fundo na latrina do planeta.
As pessoas aqui têm uma longevidade invejável e são visivelmente saudáveis. Com salários fixos e a libreta nas mãos, vão até as tiendas e compram uma cota mínima necessária a que têm direito. Para boa parte dos que conversamos, a cota não expressa toda a necessidade (e nas declarações do Estado também se fala dessa defasagem), mas garante a despreocupação com a sobrevivência. Onde se têm isso? Suíça não vale.
As melhores definições que ouvimos sobre o que se tem como mínimo necessário, incluiu arroz, carne, tabaco, vianda, café e flores.
Ainda assim, nas lanchonetes nao faltam os bocaditos (lanches simples de presunto, queijo e choriço) e as pizzas dos mesmos sabores. Somem também o prato presente em qualquer lugar: espaguetti. Batatas? Aqui, faz parte da alimentação básica as chamadas Viandas, que a nós pareceram uma boa batata-doce. Mas somos mal acostumados e sentimos um pouco de dificuldade para nos adaptarmos à falta de opções (ainda mais com uma companheira vegetariana...)

Dinheiro
Se nosso mundo é cheio de contradições, vejam esta: aqui, país socialista, temos duas moedas. Demora para conseguirmos raciocinar como os cubanos, que já estão bem acostumados.
Em um resumo grosseiro, há a moeda nacional, o peso cubano, que é usada por eles. É com ele que compram seus víveres, pegam ônibus e tudo mais.
Para os estrangeiros e para as compras que fogem do básico, há os CUCs. A moeda convertível é a únicas que nós podemos usar oficialmente. Falemos de parâmetros? Saquem papel e lápis!
- 1 CUC equivale a aproximadamente 24 pesos cubanos.
- Porém, para quase toda compra de turista o peso vale o dobro. Ou seja, 1 CUC equivale a algo como 12 pesos.
- O CUC é mais caro cerca de 10% do dólar (como 1 – 0,9). Sim, ele vale mais! Já para o euro, a referência inverte em quase 3 para 1. Enfim, gringo paga a mais porque tem mais a pagar e nós entramos no mesmo balaio.
- Poder de compra? Com 1 CUC você compra um ou vários livros, ou um a dois refrigerantes nacionais deliciosos (talvez menos de um, dependendo do lugar); ou uma pizza individual de queijo; toma uma cerveja em lata (Um adendo rápido: as duas cervejas populares daqui, Cristal e Bucanero, são gostosas); ou com mais 50 centavos toma um bom mojito em Santa Clara.
- Curiosidade: Com 1 peso cubano (1/24 de CUC) se pode assistir a uma partida de beisebol, um dos esportes mais populares por aqui, no estádio de Camaguey. Pena que a temporada só começa em novembro.

Bloqueio
Não duvidávamos, mas só os cubanos sabem o que é para a vida deles o bloqueio econômico. Há produtos que seriam corriqueiros no Brasil, mas que aqui não estão sobrando nas prateleiras, caso dos sabonetes, pastas dentais, papel, etc. Ainda assim, não falta material escolar e a criatividade brota para improvisar de tudo.
Ao invés de dezenas de opções de bonecas falantes em um shopping, não há brinquedos importados, mas segundo uma amiga, faz sucesso os brinquedos mais simples. Que tal uma boneca de trapo linda e resistente ao invés de uma com cabelos lisinhos que, acabando a bateria, é descartada?
A saúde daqui é exemplar. Cirurgias e tratamentos caríssimos em outros países, aqui saem de graça (literalmente). O mundo recorre a Cuba por seus avanços na medicina, mas se nega a liberar a compra de alguns medicamentos escassos, por exemplo.

Revolucionários
Não entrevistamos uma pessoa revolucionária na rua. Convivemos com uma ilha repleta delas. Claro que, como em todo lugar do mundo, tem gente boa e má, que quer tirar proveito do outro e principalmente do turista. Aqui não é diferente.
Mas há gente, no balcão trabalhando, recebendo você em casa, sentada na praça a descansar e que, no meio de um papo distraído, passa a analisar a política mundial com argumentos muito pertinentes. Aqui, formação política e educação são direito adquirido de fato por todos.
Não só no discurso, percebe-se na ação os valores igualitários e socialistas que tanto emanam. E mesmo com todas as dificuldades, se orgulham de sua história, se sua revolução e de seu povo. E de Fidel!
Sim, o homem é um ícone e referência para todos. Ainda bem que é alguém lúcido e com valores que, ao que parecem e nos dizem, não mudaram com o tempo, mas sim se fortaleceram. Confiar demais em uma pessoa tem suas debilidades e o que isso gerará no futuro é uma incógnita. No entanto, vemos que aqui não há uma ditadura como dizem. Todos participam e atuam para construir e reconstruir a revolução todos os dias. A revolução não é só Fidel, mas tem muito dele.
Se erraram em algo? O que sei é que temos muito que aprender com eles.

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